Irena Blühová nasceu em 2 de Março de 1904 em uma cidade localizada a noroeste da atual Eslováquia, chamada Považská Bystrica, no Reino da Hungria, na época parte do Império Austro-Húngaro. Seu pai, Móricnak Blühm, era um comerciante e a família de sua mãe, os Balázs, era composta por intelectuais e poetas. Irena estudava na cidade de Trenčín, tendo de se deslocar de sua cidade até lá diariamente, e complementava seus estudos lendo literatura clássica como Goethe (Johann Wolfgang von Goethe), Heine (Heinrich Heine) e Schiller (Friedrich Schiller). Irena tinha 5 irmãs e um irmão, e durante sua infância ela se sentia mais atraída por atividades físicas e esportivas que lhe ofereciam “liberdade”. De 1914 a 1918 , ela frequentou o ginasial de uma escola em Trenčín e foi influenciada pela imagética dos veteranos da Primeira Guerra Mundial e da Revolução Russa, além dos prisioneiros e o cansaço da população que levou àformação da República da Tchecoslováquia. Ao término da Primeira Guerra Mundial, a recessão econômica e a falta de força de trabalho da população adulta masculina levou muitas famílias a orientar suas crianças a trabalhar. Nesse contexto, Irena começou a trabalhar com 14 anos em uma firma de advocacia como secretária/datilógrafa e depois como atendente em um banco. Em 1921, ingressou no Partido Comunista Tchecoslovaco, o Komunistická strana Československa, ou KSČ.
Irena Blühhová teve o privilégio de estudar fotografia na Bauhaus, escola a qual ela dizia ter “um nível extraordinariamente alto não apenas nas artes e na pedagogia, mas também em seu humanismo, sua compaixão e sua solidariedade”. Ela se matriculou na primavera de 1931 na Bauhaus de Dessau e cursou apenas três semestres, com formação preliminar em tipografia e publicidade com o professor Joost Schmidt (1893-1948) e aulas posteriores de fotografia com o professor Walter Peterhans (1897-1960).
Blühhová contava com muitas habilidades, mesmo como autodidata mas, ao frequentar a Bauhaus, adquiriu uma tendência ao retrato, utilizou os efeitos da iluminação de diversas formas em suas produções e realizou muitos experimentos com sobreposição de negativos, fortalecendo muitas habilidades técnicas anteriores à escola.
Nesse período, Blühhová realizou muitos trabalhos experimentais, mas sempre teve como foco a fotografia social. Manteve esse interesse ao fotografar seu cotidiano na escola, capturando imagens do proletariado no local e ao se tornar membra ativa do KoStuFra (Fração Estudantil Comunista), que atuava ilegalmente na escola participando de marchas, organizando eventos com os trabalhadores, distribuindo panfletos e produzindo revistas. Nesse contexto, Blühhová atuou na distribuição do ilustrado comunista Arbeiter Illustrierte Zeitung (AIZ).
Em 1932, Irena Blühhová teve que interromper seus estudos para retornar à Tchecoslováquia devido a um chamado do Partido Comunista (KSČ). A Bauhaus teve seu fim no ano seguinte a mando do governo nazista. Após isso, trabalhou durante alguns meses para a editora Runge & Co. que realizava a impressão do Arbeiter Illustrierte Zeitung (AIZ), até abrir a sua própria editora e livraria denominada Blüh. O principal objetivo do empreendimento era a impressão de propaganda comunista e organizar reuniões para a intelectualidade do partido. Também nesse período, produziu algumas séries fotográficas em Bratislava, abordando a fome e a pobreza da classe trabalhadora industrial com o objetivo de criticar os efeitos nocivos do capitalismo As obras foram publicadas anonimamente como capas de várias revistas, incluindo a AIZ.
Nos anos seguintes, atuou em várias frentes, incluindo a co-fundação do teatro Agitprop Dielňa-Werkstatt-Mühely (Oficina), na organização de exposições documentais de esquerda como “Umenie za tovar” (do Eslovaco em tradução livre, Arte para mercadorias), na associação Soziofoto, entre outras ações.
Retomou seus estudos em 1938, neste momento em cinematografia, na Escola de Artes e Ofícios de Bratislava, apelidada de “Bauhaus da Bratislava” pelas semelhanças de abordagem. Entretanto, teve sua formação novamente interrompida em 1939 devido ao início da Segunda Guerra Mundial, que ocasionou o fechamento da escola.
A partir desse momento, juntou-se ao movimento antifascista clandestino em que foi descoberta por um espião e obrigada a se esconder pelo restante da guerra utilizando o pseudônimo Elena Fischerová. Sua família também foi perseguida, muitos parentes e alguns amigos foram perdidos no Holocausto em Auschwitz e Terezín, incluindo seu pai Móric Bluhová.
Com o estabelecimento da República Popular da Tchecoslováquia, em 1948, Blühhová trabalhou como educadora, lecionando no departamento de jornalismo e biblioteconomia da Faculdade de Artes da Universidade Comenius, além de fundar e liderar a editora Pravda e a Biblioteca Pedagógica Eslovaca. Anos mais tarde, em 1966, aposentou de sua vida política e teve alguns livros publicados, como o “O jedno prosím” (do Tcheco em tradução livre, Uma coisa por favor), além de se dedicar à fotografia de paisagens. Recebeu a medalha Josef Sudek em Berlim, tendo seu nome listado em duas enciclopédias mundiais de fotografia, Los Angeles 1983 e Genebra 1985. Após a aposentadoria, lecionou em instituições para crianças com deficiências física e mental. Irena Blühhová morreu em 30 de novembro de 1991 em Bratislava, aos 87 anos.
Entre seus principais trabalhos está uma das imagens mais radicais de Blühová, antes de entrar na Bauhaus, que retrata o pintor surrealista Imro Weiner-Král nú sobre um par de skis. A pose divertida e o contexto proposto pela foto rompem as relações convencionais entre modelo e fotógrafo, o que resultou na primeira fotografia de um homem nu feita por uma mulher na Eslováquia.
Já na Bauhaus, Irena Blühová usou a sobreposição de negativos em muitos de seus trabalhos, compondo imagens lúdicas com referências visuais surrealistas. Blühová juntou dois negativos de dois retratos: um dela mesma e outro de Weiner-Král, que foi tirado por outro aluno da instituição.
O campo de atuação da Irena Blühová era a fotografia, sendo esta culturalmente dominada por homens, mesmo que as mulheres estivessem em frente às câmeras. As mulheres sofriam – e ainda sofrem – com vários estereótipos nesse meio, como o de que a mulher é frágil e não consegue carregar equipamentos pesados e a falta de credibilidade em seus trabalhos e conhecimentos técnicos. As mulheres passam por vários processos que dificultam sua visibilidade: dificuldades para estudar, aprimorar-se, produzir conhecimento e divulgar suas pesquisas, assim como para serem reconhecidas por suas contribuições.
Referências
OTTO, Elizabeth; RÖSSLER, Patrick. Bauhaus women: a global perspective. Londres: Herbert Press, 2019.
IRENA BLUHOVA. Monoskop. Disponível em: <https://monoskop.org/Irena_Bl%C3%BChov%C3%A1>. Acesso em: 29 de Setembro de 2022.
IRENA BLUHOVA. Prvá Female First. Disponível em: <http://prvezeny.sk/bluhova-2/>. Acesso em: 29 de Setembro de 2022.
IRENA BLUHOVA. Grand Tour Of Modernism. Disponível em: <https://www.grandtourofmodernism.com/biographies/details/105/>. Acesso em: 29 de Setembro de 2022.
Vondráček, Jiří. Um documentário sobre a pioneira da fotografia social, Irena Blühová. Ceský rozhlas, 2022. Disponível em: <https://vltava.rozhlas.cz/bauhaussky-hvizd-dokument-o-prukopnici-socialni-fotografie-irene-bluhove-7901527>. Acesso em: 09 de Outubro de 2022.
QUAL É A DIFERENÇA ENTRE IMPÉRIO AUSTRO-HÚNGARO E REINO DA HUNGRIA?, 2022. Disponível em: <https://saopaulo.mfa.gov.hu/page/qual-e-a-diferenca-entre-imperio-austro-hungaro-e-reino-da-hungria#:~:text=O%20Imp%C3%A9rio%20Austro%2DH%C3%BAngaro%20era,%2C%20Cro%C3%A1cia%2C%20S%C3%A9rvia%2C%20etc.> Acesso em 14 de Outubro de 2022.
FOTÓGRAFAS RELATAM MACHISMO E DESRESPEITO NA PROFISSÃO. Resumo Fotográfico, 2017. Disponível em: <https://www.resumofotografico.com/2017/01/fotografas-relatam-machismo-e-desrespeito-na-profissao.html>. Acesso em: 17 de Outubro de 2022.
MARTINS, Patrícia. Foco nelas: mulheres fotógrafas integram coletivos contra preconceitos. Agência de notícias CEUB, 2019. Disponível em: <https://agenciadenoticias.uniceub.br/sem-categoria/foco-nelas-mulheres-fotografas-integram-coletivos-contra-preconceitos/>. Acesso em: 17 de Outubro de 2022.
Conteúdo produzido por estudantes Alexandre Oliveira Fernandes,Daniella Santiago Devecchi(instagram:@daniedevecchi),Giovana Ferreira de Paula(instagram:@giovennis),Helena Lopes Oliveira de Araujo(instagram:@helenalopx)
Mariana Dias Hashiguchi(instagram: @marihashiguchi) para a atividade "As mulheres na história do design" realizada na disciplina Teoria e História do Design 1 (Curso de Tecnologia em Design Gráfico), no segundo semestre de 2022, sob orientação da profa. Lindsay Cresto