A valorização da razão sobre a emoção pode ser notada ao longo da história do design como no caso da Escola de Ulm (1953-1968), instituição alemã de ensino de design, que norteou, inclusive, a criação de currículos no Brasil, influenciando, portanto, o modo de pensar/fazer design no país. Após conflitos internos, o professor argentino Tomás Maldonado assumiu a direção da escola, antes presidida por Max Bill, alterando a ênfase curricular segundo os preceitos do racionalismo. O ensino se tornou mais funcionalista, disciplinas artísticas e abordagens subjetivas/experimentais foram suprimidas em favor de uma “prática objetiva e científica”. Nesta conjuntura, se retomou um dos motes do design moderno: “a forma segue a função”, frase atribuída ao arquiteto estadunidense Louis Sullivan (1856-1924).
Os protótipos da louça empilhável projetada pelo aluno ulmiano Hans Roericht, em 1959, aparentam ter um compromisso com o racionalismo e também com valores do chamado “bom design” elencados pelo designer alemão Dieter Rams tais como de um produto ser discreto e honesto. A partir desta perspectiva, o conjunto de louças seria presumidamente um produto racional, “neutro” e funcional por não empregar ornamentos, cores e elementos figurativos, se valendo de formas geométricas e apenas do acromático branco. Ele também poderia ser compreendido como um design “honesto” na percepção do “bom design”, uma vez que não utilizaria ornamentos e cores para “enganar” o consumidor, desviando sua atenção daquilo que seria mais importante: a função prática do produto.
Tanto a rejeição aos ornamentos quanto a cromofobia (aversão a cores), que poderiam evocar sensibilidade e subjetividade, estão fundamentadas, possivelmente, na recusa de valores associados culturalmente às feminilidades e as chamadas culturas “primitivas”. Pois, para o evolucionista Charles Darwin, a emoção estaria relacionada a um estado primitivo, sendo encontrada principalmente nos animais, nas crianças, nas mulheres, nos idosos (sobretudo, doentes mentais) e nas “raças humanas” com poucas semelhanças com os europeus.
Sendo assim, a emoção foi articulada à debilidade, à ingenuidade e à selvageria, como um defeito que “precisaria” ser corrigido. A emoção, num registro dicotômico, foi compreendida (e ainda o é por alguns) como a causa do caos, da impossibilidade de pensar, sendo a razão, seu “oposto”, a cura deste “mal”. Esta visão endossou (e ainda endossa) variadas formas de desigualdades sociais a partir das relações de oposição entre homens e mulheres; brancos e não-brancos; adultos e crianças; adultos e idosos.
Ademais, a suposta ideia de “neutralidade” do design é improcedente, uma vez que o conceito nada mais é do que a materialização de valores relacionados historicamente às masculinidades hegemônicas. Além disso, a visão de alguns designers de que produtos poderiam “enganar” consumidores é presunçosa, visto que desconsidera a agência das pessoas assim como seus valores, experiências, desejos e visões de mundo. Por fim, o conceito de “bom design” foi criticado por diversos teóricos por ser incapaz de responder satisfatoriamente às necessidades sociais, ao menosprezar as relações emocionais entre as pessoas e a cultura material. O “Good Design” também foi criticado por impor padrões de gosto elitistas ao consumidor através de um discurso de bom senso e eficiência.
Vale ressaltar ainda que a oposição entre razão e emoção se trata de um mito dicotômico, visto que as dimensões afetiva e racional são indissociáveis, se constituindo mutuamente. Por um lado, a emoção se inicia de um raciocínio, da interpretação do indivíduo com relação a situação em que está imerso. Por outro lado, as emoções são indispensáveis para a “racionalização”, uma vez que nos alertam sobre nossos limites e valores, sendo capazes de estimular mudanças a respeito dos modos de ser e estar no mundo.
Texto: Maureen Schaefer França