Otti Berger

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Nascida Ottilija Ester Berger em 4 de outubro de 1898, na pequena cidade de Zmajevac onde hoje fica a Croácia, Otti Berger foi aluna e professora na Bauhaus (1919-1933), e destacou-se na área têxtil e na tecelagem. Otti se formou na Academia Real de Artes e Ofícios em Zagreb em 1926, e logo a formatura inscreveu-se na Bauhaus. Ela estudou na escola de 1927 a 1930, recebendo orientações de três mestres: Paul Klee, Wassily Kandinsky e Laszlo Moholy-Nagy e frequentou o ateliê de tecelagem. Moholy-Nagy procurava treinar nos/as estudantes técnica, trabalho experimental e principalmente o senso de toque, classificando estudantes como “placas táteis”. Moholy-Nagy surpreendeu-se com um dos trabalhos de Otti, composto por  uma faixa de tecido metálico bordado com triângulos de cores variadas, com quadrados inseridos que quase poderiam ser “lidos” pelos dedos como um tipo de alfabeto braile. Os estudos de aquarela com composição de cores e gradientes mostravam a influência das aulas de Paul Klee, que ajudaram a desenvolver as habilidades de Otii.

Quando Otti tornou-se estudante do ateliê de tecelagem sob a coordenação de Gunta Stölzl em Dessau, o principal objetivo não era criar peças artísticas únicas e sim desenvolver padrões que pudessem ser produzidos industrialmente em massa. Foi neste momento que o ateliê de tecelagem manual transformou-se em ateliê de design têxtil e estudantes como Otti Berger e Anni Albers tornaram-se designers industriais bem sucedidas (OTTO; RÖSSLER, 2019). Após passarem um semestre na escola de tecelagem de Estocolmo em 1929, Albers e Berger substituíram Gunta Stölzl quando deu à luz sua primeira filha. Entre as responsabilidades de Otti estava a produção de tecidos para a Escola Sindical Nacional de Bernau, sob supervisão de Hannes Meyer, então diretor da Bauhaus. Baseada no conceito de “tecidos para interiores”, Otti analisava e criava tecidos de acordo com os princípios de Moholy-Nagy sobre estrutura, textura, fabricação e cor, numa estreita relação com a nova arquitetura defendida na época (OTTO; RÖSSLER, 2019). Otti concordava com Meyer de que na decoração não havia espaço para superficialidades, pois praticidade e funcionalidade deveriam prevalecer como na arquitetura e argumentava: “Por que nós ainda precisamos de flores, videiras e ornamentos? A própria fábrica está viva!” (OTTO; RÖSSLER, 2019).

Gunta Stölzl afirmou que o trabalho de Otti estava entre os melhores criados no ateliê. Após uma forte campanha antissemita, Gunta se afastou da escola em 1931 e indicou Otti para substituí-la. Otti coordenou o ateliê por um ano, fez parte do júri da Bauhaus que recomendava produção de tecidos em parceria com indústrias. Em 1932, o então diretor Mies van der Rohe, contratou Lilly Reich para o ateliê e Otti permaneceu meio período auxiliando no ateliê, já que Lilly não conhecia tecelagem. Em 1932, Otti deixou a escola e levou sua experiência na criação de seu próprio estúdio, o Tecidos Otti Berger. Otti teve sucesso com o ateliê, e sua vida profissional parecia estabilizada. Com apoio de Walter Gropius, fundador e o primeiro diretor da Bauhaus, recebeu encomendas de várias empresas e produziu os interiores da Casa Schminske, do arquiteto Hans Scharoun. Em 1934 mantinha-se visível e ativa na carreira como resultado de sua persistência em registrar patentes de seus tecidos e fazendo valer sua marca registrada.

“tocar um tecido com as mãos pode ser tão prazeroso quanto uma cor para os olhos ou um som para os ouvidos” Otti Berger (OTTO; RÖSSLER, 2019)

Algodão, cerca de 1930.

Com o  início da Segunda Guerra Mundial e a perseguição de pessoas de origem judaica, Otti foi proibida de continuar trabalhando pelo Reich. Planejando fugir, Otti precisava de vistos para poder viajar até os Estados Unidos, pois László Moholy-Nagy havia convidado a designer a lecionar na Nova Bauhaus em Chicago, onde seu marido Ludwig Hilberseimer estava. Otti se refugiou na Inglaterra até 1938, porém não conseguiu encontrar trabalho com remuneração adequada, nem formar uma comunidade em Londres e Manchester, embora tenha registrado patentes de produtos. Enquanto aguardava o visto, decidiu visitar a mãe doente na Croácia, contrariando o pedido de seu marido para não viajar. Em 1944, foi capturada pelos nazistas, enviada para Auschwitz e no mesmo ano foi morta.

Apesar de ser uma escola de design com viés progressista e modernista, na Bauhaus havia uma clara distinção entre os tipos de ofícios considerados adequados aos gêneros. As artes têxteis, cerâmica, aquarelas e tecelagem eram atividades consideradas como trabalhos de execução e reprodução, que não exigiam grande criatividade artística. Já a escultura, arquitetura, marcenaria e trabalho com metais eram atividades reservadas aos homens, considerados mais capazes de percepções artísticas criativas mais elevadas. Tais concepções explicam as razões pelas quais as mulheres da Bauhaus concentraram-se nas áreas de tecelagem e cerâmica, apesar de não existirem restrições de gênero nas inscrições da escola. Durante seu tempo na oficina de tecelagem, Otti produziu diferentes padrões, texturas, modelos e peças têxteis seguindo os princípios modernistas da Bauhaus, que permitiram a reprodução por aprendizes do ofício, porém sem ignorar os elementos estéticos de cada criação.

Os padrões têxteis são compostos de combinações de celofane, fibra, cânhamo, seda, linho ou algodão, feitos em diversas técnicas de tecelagem e crochê. Grande parte desses padrões eram reproduzidos em larga escala por estudantes, formando várias colchas que eram usadas para cobrir e revestir móveis, como sofás e cadeiras. As técnicas de tear e tecelagem comumente utilizadas por Otti Berger contém nós flutuantes entre o urdume e a trama, onde as ligações entre fios ficam expostas. Algumas de suas criações possuem tecido duplo, onde o verso do pano possui um material e estilo diferente da frente, que é o resultado de tecelagem complementar entre duas sarjas de proporções horizontais e verticais variadas. A maioria dos seus trabalhos não têm títulos específicos, nem mesmo uma data de produção correta. Grande parte dos produtos em acervo foram presenteados por ex-alunos e parentes, que conseguiram preservar algumas das criações de Otti Berger.

Otti Berger (frente) e Lis Beyer em um barco em Elbe, 1927. Bauhaus-Archiv, Berlim.

Referências

ANDRADE, Ana Beatriz Pereira de; MAGALHÃES, Ana Maria Rebello; OLIVEIRA, Paula Rebello Magalhães de; AQUINO, Henrique Perazzi de. As meninas da Bauhaus. Anais do 9º CDI e 9º CONGIC, Belo Horizonte, v. 9, p. 1394-1402, 14 nov. 2019. Disponível em: https://pdf.blucher.com.br/designproceedings/9cidi/3.0271.pdf. Acesso em: 1 out. 2023.

ART INSTITUTE OF CHICAGO (USA). The Collection. In: Otti Berger. [S. l.], [2014?]. Disponível em: https://www.artic.edu/collection?q=otti%20berger. Acesso em: 2 out. 2023.

BAUHAUS KOOPERATION (Alemanha). Otti Berger: 1927–1930 Student / 1931–1932 deputy head of Weaving at Bauhaus Dessau. In: Koepfe: Biografien. Alemanha: Bauhaus, 2012. Disponível em: https://bauhauskooperation.com/wissen/das-bauhaus/koepfe/biografien/biografie-detail/person-76. Acesso em: 1 out. 2023.

DROSTE, Magdalena. Bauhaus 1919-1933: Bauhaus Archiv. 1. ed. Alemanha: Bauhaus-Archiv Museum fur Gestaltung, 1994. 259 p. Disponível em: https://toaz.info/doc-view-2. Acesso em: 1 out. 2023.

FABRIC HOUSE (União Europeia). Fabric House Society. In: Woven Fabrics. [S. l.], [?]. Disponível em: https://www.fabric-house.eu/int/information/woven-fabrics/. Acesso em: 2 out. 2023.

OTTO, Elizabeth; RÖSSLER,Patrick. Bauhaus women: a global perspective. Herbert Press: Londres, 2019.   

Trabalho desenvolvido na disciplina de Teoria do Design 1 por Bárbara Fernandes, Beatriz Grande, Danilo Fernandes e Lucas Fernandes, estudantes do curso de Bacharelado em Design da UTFPR, com a colaboração e revisão de Lindsay Cresto.

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